O deputado
Jean Wyllys (PSOL-RJ) tem a mania de tratar como inimigas as pessoas
que discordam dele. Pior: parece achar que a homofobia é a única razão
que leva a essa discordância. É um sestro que carrega lá do BBB. Quando
foi indicado para o paredão, Pedro Bial quis saber por que, na sua
opinião, fora o mais votado.
Ele mandou bala: “Vai ver é porque eu sou
gay”. Ali nascia o seu vitimismo agressivo e triunfante. Como os demais
participantes não eram gays, não podiam usar essa condição a seu favor. O
que diriam, afinal: “Fui indicado porque sou louro”, “fui indicada
porque sou mulher”, “fui indicado porque sou morena”, “fui indicado
porque sou hétero”? Wyllys acabou levando a bolada. Agora deputado, em
companhia de dois outros colegas, os petistas Érika Kokay (DF) e
Domingos Dutra (MA), Wyllys fez uma coisa feia: resolveu apelar à
Procuradoria-Geral da República para criminalizar seus adversários
políticos ou intelectuais. E ainda diz que o faz em nome da liberdade.
Um dos alvos, claro!, é o deputado Marco Feliciano (PSC-SP), presidente
da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara. Outro é o pastor
Silas Malafaia — nesse caso, então, a coisa vai além das franjas do
absurdo. Já chego ao ponto. Antes, algumas considerações.
Democracia decadente e controle da mídia
Escrevi ontem à noite um texto sobre
aquelas 70 pessoas que foram ao Palácio do Planalto protestar contra
Feliciano portando velas acesas. Exigiram que a presidente Dilma
Rousseff se manifeste contra o deputado do PSC. Cobraram que a chefe do
Executivo atue contra uma comissão do Legislativo. Sob o pretexto de
defender as minorias e os direitos humanos, propõem, sem pestanejar, a
violação de um dos pilares do regime democrático. Conhecem o pensamento
de Wyllys, é certo, mas devem achar que Montesquieu era um banana com
aquele negócio de independência entre os Poderes.
A
evidência de que a democracia brasileira se degrada não está na
manifestação em si — ao contrário: coisas assim só são possíveis em
sociedades livres. O sintoma da decadência está no fato de que amplos
setores da imprensa aplaudem o que é um convite à violência
institucional.
A turma,
aliás, que quer o “controle social da mídia” — viu, Zé Dirceu?; viu, Rui
Falcão? — já sabe o bom mau caminho: o negócio é fazer as Blitzen
no Congresso e sair por aí acedendo velas. Depois virão o “controle
social das piadas”, “o controle social da opinião”… O Brasil vai ficar
lotado de aiatolás bondosos dizendo o que podemos pensar ou não, o que
podemos dizer ou não, que religião podemos ter ou não. Os que acreditam
em Deus devem deixar de lado essa ideia estúpida de absoluto e acreditar
em Wyllys — que já venceu Montesquieu, como é sabido. Faço uma ironia,
mas a coisa é séria.
A acusação
A representação criminal contra um grupo de pessoas, que inclui Feliciano e Malafaia, está na página do próprio deputado do PSOL.
A representação criminal contra um grupo de pessoas, que inclui Feliciano e Malafaia, está na página do próprio deputado do PSOL.
A íntegra está aqui.
Há uma penca de acusações: difamação, calúnia, falsificação de
documentos, formação de quadrilha, falsidade ideológica e improbidade
administrativa. As acusações são muitas porque eles querem transformar
uma penca de pessoas em rés. Deve ser uma das peças mais absurdas em que
pus os olhos nos últimos tempos. Fica óbvio que Wyllys e os demais
deputados se querem acima das críticas. O parlamentar do PSOL parece
achar razoável sair por aí acusando os desafetos de racistas,
homofóbicos, fundamentalistas etc., mas se zanga quando eles reagem.
Muito bem!
Qual é a principal peça que apresentam contra Feliciano? Um vídeo
(abaixo), divulgado pelo deputado em seu Twitter, com crítica à atuação
de alguns deputados que o atacam. Se alguém quiser ver, segue abaixo.
Retomo depois.
Retomo
É evidente
que há aí um trabalho de edição que pode dar acento exagerado a
determinadas falas, eventualmente distorcendo-lhes o sentido. Mas
pergunto: é coisa muito diferente do que os militantes fizeram com
várias falas do próprio deputado? Será mesmo uma agressão mais severa do
que aquelas que ele passou a enfrentar cotidianamente, seja na
comissão, seja à porta das suas igrejas, seja nas redes sociais? Então o
pau que bate em Chico é diferente daquele que bate em Francisco? Ora…
Mas isso fica para a Procuradoria-Geral.
No caso de
Malafaia, o troço, como escrevi, vai além das franjas do absurdo. A
representação usa esta mensagem de uma página de Facebook contra o
pastor:
Página falsa
Ocorre que esse é um perfil
falso. Não pertence ao líder religioso. O verdadeiro não é “Pastor Silas
Malafaia”, como vai acima, mas “Silas Malafaia Oficial”. O curioso é
que a própria representação fala sobre a existência de perfis falsos,
mas parte do princípio de que os responsáveis por eles são justamente os
que têm seus respectivos nomes usados à revelia.
Wyllys não
disse aquelas sandices à CBN. Ocorre que Malafaia também não postou a
tal mensagem. Há um tuíte que é, de fato, de autoria do líder religioso,
mas se insere perfeitamente no direito que as pessoas têm à crítica —
ou Wyllys e os dois outros deputados pairam acima das divergências?
A dita
representação criminal é um saco de gatos. E me parece que a aberração
técnica é mais método do que loucura. Por quê? Com base numa reportagem
da Folha, por exemplo, acusam Feliciano de improbidade administrativa
por causa de funcionários oficialmente lotados em seu gabinete, mas que
serviriam à denominação religiosa à qual ele é ligado. Muito
bem! O que isso tem a ver com Malafaia e com alguns outros que estão
sendo acusados por delitos que, entendo, são de opinião? Resposta: NADA!
O trio só está interessado em juntar adversários no mesmo saco de
gatos.
Chega a
ser uma piada que Wyllys processe Feliciano, dizendo-se perseguido. Ora,
quem é que lidera a campanha nacional contra o presidente da comissão?
Incluir Malafaia na peça acusatória é a evidência escancarada de má-fé.
Ele não é político, não está na comissão — é, apenas, alguém com o
direito a uma opinião. Mas com direito à SUA opinião, não a de um falso
perfil.
Espero que
a mesma imprensa que está endossando esse espetáculo de intolerância
não venha a pagar caro por sua estupidez. Está confundindo o direito à
divergência e ao protesto — e as praças estão aí para isso — com a “boa
censura”, como se isso fosse possível.
Não
queremos ser tutelados pelo estado, certo? E creio haver um razoável
consenso nisso (os petistas discordam, desde que eles sejam o estado,
claro!). Cumpre indagar se a tutela exercida por minorias — ou maiorias —
organizadas é legítima. Para alguém que se orienta segundo os critérios
da democracia política, a resposta é uma só: NÃO!
A imprensa
brasileira, com as exceções costumeiras, vive um momento vergonhoso.
Entende, de modo estúpido, que a única censura que se deve repudiar é a
legal. Se um dia lhe ocorrer de escarafunchar a biblioteca, verá que há
outra tão ou mais perversa: aquela que pretende censurar mais do que a
liberdade de expressão; pretende impedir o próprio exercício do
pensamento em nome de valores supostamente infensos a quaisquer
questionamentos.
Resta-nos
aguardar agora o “controle social da piada”. Os humoristas podem começar
a treinar as piadas construtivas. Nessa toada, a liberdade,
especialmente na Internet, está com os dias contados. Se acham que o
cristianismo, que eles adoram esculhambar — e o fazem, felizmente, sem
qualquer censura —, é uma religião problemática, é porque não conhecem o
laicismo controlado por alguns fanáticos.
Peço ponderação nos comentários. O país não precisa de mais linchadores, mas de mais pensadores. O exercício da opinião dispensa acusações, agressões, demonizações. Vale para este post e para todos os outros.
Por Reinaldo
FONTE: VEJA
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